Para os cientistas, o senso de justiça desses animais vem não apenas da influência humana, mas de um ancestral em comum dos lobos e cães
Revista Veja – 9 jun 2017
Além de homens e certos primatas, cães e lobos também são sensíveis a injustiças. Pesquisas anteriores feitas com cachorros, já indicavam que estes animais paravam de cooperar quando tratados de forma injusta, o que os cientistas acreditavam ser uma característica vinda da domesticação e convivência com humanos. No entanto, um estudo publicado nesta quinta-feira na revista científica Current Biology, demonstra que lobos também reagem à injustiça. Para os pesquisadores, isso é um indício de que o senso de justiça, crucial para a cooperação entre indivíduos, percebido nesses animais vem não apenas da influência humana, mas de um ancestral em comum dos lobos e cães.
Cães e justiça
Para verificar a reação de cães e lobos, ancestrais dos cães, a situações de injustiça, pesquisadores do Wolf Science Center, da Universidade de Medicina Veterinária de Viena, na Áustria, treinaram os animais para apertarem um botão em troca de comida — ração ou carne. Em seguida, colocaram dois indivíduos da mesma espécie, que haviam sido criados em grupo de maneira semelhante, lado a lado, de maneira que pudessem se enxergar, enquanto o treinador ficava à frente, oferecendo as recompensas.
Os animais apertavam o botão tranquilamente se recebessem a mesma comida, mas, quando ambos realizavam a mesma tarefa e o treinador entregava a recompensa para apenas um deles, ou oferecia ração a um dos indivíduos enquanto o outro ganhava carne, os animais injustiçados ficavam incomodados e paravam de apertar os botões. Eles se recusavam a retornar ao jogo e os lobos tinham respostas ainda mais rápidas que os cachorros, possivelmente, segundo os pesquisadores, porque os animais domesticados desejam colaborar com os humanos. As duas espécies, contudo, paravam de participar do jogo após o tratamento desigual.
Mas, quando os cães e lobos fizeram o mesmo teste sem outro animal ao lado, eles continuaram a apertar a campainha se solicitados, mesmo sem a recompensa. Para Friederike Range, também autor do estudo, “isso mostra que o fato de eles mesmos não terem recebido recompensa não era a única razão para terem parado de cooperar com o treinador. Eles se recusaram a colaborar porque o outro ganhou algo e ele não”, disse, em comunicado.
Ancestral comum
A hierarquia dentro dos grupos também teve influência no resultado. “Animais ao topo da hierarquia (os machos-alfa) ficavam frustrados mais rapidamente com a injustiça porque eles não estão acostumados com essa situação: não receber nada ou receber algo de qualidade inferior”, disse Range.
Depois dos testes, os pesquisadores analisaram ainda se os animais interagiam com o treinador em um recinto neutro. Os lobos que haviam sido injustiçados ficaram afastados de humanos, mas os cães não. “Mesmo que esses cães não vivam diretamente com humanos, eles são mais dóceis conosco. Neste ponto, a domesticação parece influenciar o comportamento canino. Seu contato próximo com humanos como animais de estimação poderia, assim, reduzir as reações a injustiças em vez de desencadeá-las”, afirmou o pesquisador.
Segundo os pesquisadores, o senso de justiça apurado é um comportamento herdado, possivelmente de um ancestral comum de cães e cachorros. Além disso, os cientistas concluíram ainda que aversão à injustiça identificada pelo experimento é comparável à encontrada em primatas não-humanos e que ela está, provavelmente, ligada à evolução da cooperação nos animais.
Fonte: Veja